Thursday, October 20, 2005

O REGRESSO A MOÇAMBIQUE

2.º/3.º dias (19 e 20 de Outubro) – MAPUTO

Vem-me o esforço de memória a propósito de Maputo. De carro ou andando a pé pelas Avenidas 24 de Julho (a única das 5 grandes avenidas que cruzam a cidade de lés a lés que manteve o toponímio do tempo colonial), 25 de Setembro (ex-Av. da República) ou pelas restantes ruas da cidade, pude constatar que a capital moçambicana me pareceu irreal, diferente do resto de Moçambique, pela bem menor decadência física por contraste por ex. à cidade da Beira, pelos sinais de vitalidade económica, social e cultural que apresenta.
Na expressão feliz do meu amigo de infância Rui Basílio, que por lá continua, «Maputo não é Moçambique» e para tanto basta deslocar-nos 100/200 Kms para fora da capital para verificarmos da certeza de uma tal asserção. Digamos que o “Norte” começa assim que acaba Maputo, não por eu sofrer da visão sulista da Frelimo, mas porque se percebe que a capital isolou o resto de Moçambique e a tendência para alguém que vem de fora é encarar o resto de Moçambique como um exótico litoral de praias e ilhas exóticas (Tofo, Bilene, Bazaruto, Pemba, Quirimbas) e paraísos turísticos, quando a realidade é bem outra.
A dinâmica que atravessa Maputo vê-se no surto de construção de novas habitações principalmente na zona que medeia entre a Polana (na antiga Polana caniço) e a Costa do Sol, nas quais se integram as novas e sumptuosas embaixadas (como a da China) grandiosos condomínios privados com a curiosidade de aqui utilizarem para a sua designação a expressão latina “condominium” aposta à entrada dos mesmos, na sua excelente oferta hoteleira (para além dos ex-libris Polana e Cardoso, existem agora os também luxuosos Avenida, Vip Maputo, Girassol, Holiday Inn) e da restauração (que vai dos antigos Piri-Piri, Cristal, Costa do Sol, Clube Naval, Marítimo todos recuperados, aos novos Monte Alentejano, Rodízio, Sagres, Marítima, etc., etc.), mas também na dinâmica cultural, da literatura (para além de Mia Couto, os novos Rogério Manjate e Suleiman Cassamo) às artes (nomes como Naguib, Saranga, Ndlozy que prometem continuar o luminoso caminho do grande mestre Malangantana) à música, onde editoras dão à luz novos autores e intérpretes, e na cena nocturna em que para além do tradicional Sheik, existem agora, entre outros, o Coconuts, Sinatra, e até clubes de jazz como o Africa Bar e o Chez Rangel Jazz Café (propriedade do grande fotógrafo moçambicano Ricardo Rangel) que colocam novos sons e jazz na rota dos moçambicanos mas também de todos, sul-africanos, brancos e negros, portugueses, italianos, nórdicos, brasileiros, enfim da diversidade de raças e nacionalidades que vagueiam pela cosmopolita Maputo, herdeira no fundo da sua antecessora Lourenço Marques expressa na geração de moçambicanos que a deixou no pós-independência da qual faziam parte, entre outros, os poetas Rui Knopli, Alberto de Lacerda, Helder Macedo e Virgílio de Lemos, o cineasta Ruy Guerra, os filósofos Fernando Gil e José Gil (sim, esse mesmo o do “Portugal Hoje - O Medo de Existir” nascido em Muecate na província de Nampula) o arquitecto Pancho Miranda Guedes, o fotógrafo Pepe Diniz, a pintora Bertina Lopes e o ensaísta Eugénio Lisboa.
Claro que não há bela sem senão, porque não resiste a um simples olhar que tudo isto coexiste com a pobreza extrema (que se expressa em Moçambique nos índices trágicos de quase 52% nas zonas urbanas e de mais de 55% nas zonas rurais) e de que a qualidade de vida da generalidade da população da capital moçambicana é, mesmo no meio da abundância, extremamente baixa.
A Maputo de hoje, embora situada no extremo sul do território é a centralidade do país e onde tudo se decide, vive, usufrui, goza, mas em quaisquer dos casos nos sentimos bem
.

Comments: Post a Comment

<< Home

This page is powered by Blogger. Isn't yours?