Friday, April 08, 2005

HISTÓRIA DE CAHORA BASSA ( 4 )

Os prazos da Coroa

Pouco mais de um século tinha passado, desde a primeira viagem de Vasco da Gama, e a Coroa Portuguesa tenta implantar um método de "ocupar" as terras africanas, de entre os quais o sistema dos «prazos» foi, sem dúvida, um dos mais importantes - em troca de uma renda, então chamada "foro", uma determinada parcela de terra, bem como os seus habitantes, era entre­gue por "três vidas", tendo como contrapartida os prazeiros de, além do pagamento da renda, manter os caminhos em bom estado, defender o seu espaço e cobrar o imposto.
Curiosa, no mínimo, era a forma como, inicialmente, a sucessão dos prazos era feita, pois fosse por tradição local - as sociedades matriliniares -, fosse pela tentativa de garantir o máximo de sangue europeu, a lei estabelecia a herança através de "pessoas do sexo feminino, descendentes de portugueses da Europa com obrigação de casarem com portugueses de igual origem; e na sucessão das vidas a fêmea excluía o varão" - isto é, as mulheres tinham sempre prioridade na obtenção de um prazo e a sua herdeira era a filha mais velha, apenas no caso desta não existir, o prazo passaria para o filho ou para o marido.
Teoricamente, eram motivos suficientes para a Coroa retirar as terras aos seus possuidores, o casamento em desconformidade com a lei, o facto de não residir no prazo ou, ainda, o de não o valorizar - todas estas dificuldades, impostas por Lisboa, pretendiam o fortale­cimento da colonização europeia, bem como travar o cres­cimento dos prazos, mas nada disto foi conseguido, antes pelo contrário.
De facto, se por um lado rareavam os portugueses euro­peus, por outro o escoamento dos produtos agrícolas do interior era difícil, senão impossível, pelo custo que acarretava, e para agravar este panorama, existiam comér­cios altamente rendíveis que comprometiam o futuro da agricultura, tais como o marfim e o ouro e, fundamentalmente, os escravos, que possibilitavam, a quem os transaccionava, a rápida obtenção de fortunas incalculá­veis e, com elas, o poder.
Foi deste modo que muitos dos senhores dos prazos viram aumentar o seu território e, consequentemente, a fortuna e poder, de uma maneira que talvez os Governos de então nem suspeitassem vir a ser possível. Existem relatos de prazos de proporções impressionantes: "Por exemplo: o prazo de Cheringoma situado no local entre a futura Beira e o Zambeze (com uma frente marítima de 200 km), ladeava a margem sul do rio ao longo de 180 km e ocupou o interior até ao rio Zangue, fronteira do macro-prazo da Gorongosa (...) onde havia em 1802, 2120 aldeias africanas e que exigia vinte dias de marcha para ser atravessado.
Outro prazo, no inte­rior do distrito de Quelimane, tinha em 1843-1846 uma superfície superior à de Portugal e possuía 30 000 habi­tantes”.
Em resposta a este enorme poder e à consequente mono­polização comercial, a partir do início do séc. XIX, o comércio do ouro e do marfim foi sendo gradualmente desviado para rotas mais favoráveis a afri­canos e suahilis, ficando os prazeiros apenas com uma mercadoria de alto lucro, o escravo - era o começo do fim dos prazos e dos seus senhores, que começaram por vender os colonos das suas terras, e chega­ram a tal sangria da população que foram obrigados a vender os seus próprios "chicundas", e outros invadiam prazos mais fracos subtraindo-lhes população. O resul­tado desta destruição das fontes de obtenção de riqueza dos prazos, foi a ocupação pelos vizinhos mais fortes que, pouco a pouco, os foram conquistando, opor­tunidade não desperdiçada pelo Estado do Barué, ou pelo próprio Monomotapa que ocuparam terras fronteiriças aos seus territórios, tendo este último chegado as portas de Tete.
Outra das mudanças operadas na região foi a movimen­tação dos Ngunis (ou Angunes) que, vindos do Natal, subiram até à região do Zambeze, e se insta­laram na zona de Gaza, fundando um Estado que só iria cair às mãos de Mouzinho de Albuquerque, no deco­rrer das guerras de "pacificação"
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