Thursday, April 07, 2005
HISTÓRIA DE CAHORA BASSA ( 3 )
Os primeiros contactos dos portugueses
A primeira notícia que, em Portugal, se encontra deste magnífico rio chega-nos através do «Diário de Álvaro Velho» da viagem de Vasco da Gama de descoberta do caminho marítimo para a Índia. Neste relato, ao actual Zambeze chamaram o "Rio dos Bons Sinais", sinais que não eram, de acordo com o narrador daquela viagem, os do interior da terra que nessa altura tocaram, mas os que indicavam que íam chegando para onde desejávam, ou seja, à Índia.
De qualquer modo, não tardou muito para que os primeiros portugueses, recém chegados à costa de Moçambique, gradualmente, se interessassem pelo interior através do Zambeze. Na verdade, são inúmeras as referências à penetração para o interior, logo a partir do primeiro quartel do século XVI. Assim, segundo René Pélissier, "Os Portugueses, deixando de vegetar no forte de Sofala (1505), que nunca teria a importância do da ilha de Moçambique, penetraram no interior, pela primeira vez, em 1513, na direcção das terras do "Mwene Mutapa" e infiltraram-se igualmente ao longo do Zambeze. Substituindo gradualmente os Suahilis, instalaram as suas feiras (1) os seus sertanejos, os seus mestiços e as suas guarnições na direcção das minas ".
O território em causa era, já na altura, uma zona de excepção de penetração por parte dos exploradores portugueses, conclusão tirada ao depararmos com os relatos de outros historiadores que referenciam estes factos. E o caso de Francisco Bethencourt e de Russell-Wood que afirmam que a presença portuguesa em África, em especial em Moçambique, raramente ultrapassou os limites dos portos e fortalezas costeiras, tendo falhado, pelo menos até ao século XIX, as diversas tentativas de exploração e ocupação das terras de interior, excepto no que concerne a regiões bem delimitadas como é o caso do Zambeze. Aqui, a partir da costa, verificou-se "uma dispersão de portugueses de Moçambique (ilha) pelo vale do Zambeze acima até Sena e Tete, chegando à zona do Planalto".
Estes primeiros exploradores eram, fundamentalmente, comerciantes e aventureiros que procuravam riquezas num espaço desde há muito conhecido localmente como generosamente dotado de produtos raros. Data de 1505 a existência de uma fortaleza, instalada por Pêro d'Anaia (2) em Sofala, com a qual se pretendia controlar o comércio que chegava à costa, a exemplo do que, anos antes, se tinha feito na costa atlântica - São Jorge da Mina - com os excelentes resultados que se conhecem. Era, em especial, o ouro que se pretendia resgatar, em que a observação feita pelos portugueses a esse comércio, efectuado entre africanos e "mouros", dava-lhes indicações que se poderia ganhar "cento por um" nas transacções que efectuavam a partir dos seus barcos.
Contudo, tornava-se necessário que fossem apreendidas as necessárias diferenças entre as gentes que aqui acorriam a negociar - que ficaram então conhecidas por Cafres - e aquelas outras que chegavam à Mina. Os súbditos desse grande soberano Mwene Mutapa, ou Monomotapa, estavam há muito integrados nas redes comerciais do Índico e os produtos que os portugueses lhes ofereciam não eram apreciados, pois o que queriam era "cambaia", ou seja, «panos», tanto assim que a partir do momento que se tornou clara essa realidade, o ouro começou a correr.
Mas os comerciantes queriam mais, e essa foi uma das razões para que a penetração para o interior se concretizasse, caminho que levava ao reino de Monomotapa e das suas riquezas, instalando-se nos melhores locais de comércio: Quelimane, Sena, Tete ou, mais tarde, o Zumbo, todos junto ao Zambeze que, já na época, funcionava como via de comunicação.
Com o decorrer do tempo as fixações no vale do Zambeze foram-se transformando, evoluindo ao sabor das lutas pelo domínio do comércio, do espaço e das gentes - uma das características que muitos dos portugueses adquiriam em Moçambique em geral, e neste espaço em particular, era uma certa assimilação da cultura local. Sobre este assunto Russell-Wood afirma que "são ilustrativos (os potenciais modos) da «indianização» ou «africanização» de alguns homens portugueses (...) muitos deles foram totalmente assimilados em termos religiosos, culturais, comportamentais e linguísticos (...). Para utilizar a expressão utilizada por Allan Isaacman aos prazeiros do vale do Zambeze, esses portugueses transformaram-se em transfrontiersmen. (...) se houve indivíduo cujos feitos, factuais ou fictícios, preconizam muitas das características dos portugueses que viveram «fora do império», esse indivíduo foi o alter ego criado por Fernão Mendes Pinto». Uma das explicações mais utilizada para que este facto se verificasse mais em Moçambique, do que nas outras colónias, foi a da maior distância que separa este país de Portugal, o que contribuía para esse, também maior, afastamento físico e psicológico.
A primeira notícia que, em Portugal, se encontra deste magnífico rio chega-nos através do «Diário de Álvaro Velho» da viagem de Vasco da Gama de descoberta do caminho marítimo para a Índia. Neste relato, ao actual Zambeze chamaram o "Rio dos Bons Sinais", sinais que não eram, de acordo com o narrador daquela viagem, os do interior da terra que nessa altura tocaram, mas os que indicavam que íam chegando para onde desejávam, ou seja, à Índia.
De qualquer modo, não tardou muito para que os primeiros portugueses, recém chegados à costa de Moçambique, gradualmente, se interessassem pelo interior através do Zambeze. Na verdade, são inúmeras as referências à penetração para o interior, logo a partir do primeiro quartel do século XVI. Assim, segundo René Pélissier, "Os Portugueses, deixando de vegetar no forte de Sofala (1505), que nunca teria a importância do da ilha de Moçambique, penetraram no interior, pela primeira vez, em 1513, na direcção das terras do "Mwene Mutapa" e infiltraram-se igualmente ao longo do Zambeze. Substituindo gradualmente os Suahilis, instalaram as suas feiras (1) os seus sertanejos, os seus mestiços e as suas guarnições na direcção das minas ".
O território em causa era, já na altura, uma zona de excepção de penetração por parte dos exploradores portugueses, conclusão tirada ao depararmos com os relatos de outros historiadores que referenciam estes factos. E o caso de Francisco Bethencourt e de Russell-Wood que afirmam que a presença portuguesa em África, em especial em Moçambique, raramente ultrapassou os limites dos portos e fortalezas costeiras, tendo falhado, pelo menos até ao século XIX, as diversas tentativas de exploração e ocupação das terras de interior, excepto no que concerne a regiões bem delimitadas como é o caso do Zambeze. Aqui, a partir da costa, verificou-se "uma dispersão de portugueses de Moçambique (ilha) pelo vale do Zambeze acima até Sena e Tete, chegando à zona do Planalto".
Estes primeiros exploradores eram, fundamentalmente, comerciantes e aventureiros que procuravam riquezas num espaço desde há muito conhecido localmente como generosamente dotado de produtos raros. Data de 1505 a existência de uma fortaleza, instalada por Pêro d'Anaia (2) em Sofala, com a qual se pretendia controlar o comércio que chegava à costa, a exemplo do que, anos antes, se tinha feito na costa atlântica - São Jorge da Mina - com os excelentes resultados que se conhecem. Era, em especial, o ouro que se pretendia resgatar, em que a observação feita pelos portugueses a esse comércio, efectuado entre africanos e "mouros", dava-lhes indicações que se poderia ganhar "cento por um" nas transacções que efectuavam a partir dos seus barcos.
Contudo, tornava-se necessário que fossem apreendidas as necessárias diferenças entre as gentes que aqui acorriam a negociar - que ficaram então conhecidas por Cafres - e aquelas outras que chegavam à Mina. Os súbditos desse grande soberano Mwene Mutapa, ou Monomotapa, estavam há muito integrados nas redes comerciais do Índico e os produtos que os portugueses lhes ofereciam não eram apreciados, pois o que queriam era "cambaia", ou seja, «panos», tanto assim que a partir do momento que se tornou clara essa realidade, o ouro começou a correr.
Mas os comerciantes queriam mais, e essa foi uma das razões para que a penetração para o interior se concretizasse, caminho que levava ao reino de Monomotapa e das suas riquezas, instalando-se nos melhores locais de comércio: Quelimane, Sena, Tete ou, mais tarde, o Zumbo, todos junto ao Zambeze que, já na época, funcionava como via de comunicação.
Com o decorrer do tempo as fixações no vale do Zambeze foram-se transformando, evoluindo ao sabor das lutas pelo domínio do comércio, do espaço e das gentes - uma das características que muitos dos portugueses adquiriam em Moçambique em geral, e neste espaço em particular, era uma certa assimilação da cultura local. Sobre este assunto Russell-Wood afirma que "são ilustrativos (os potenciais modos) da «indianização» ou «africanização» de alguns homens portugueses (...) muitos deles foram totalmente assimilados em termos religiosos, culturais, comportamentais e linguísticos (...). Para utilizar a expressão utilizada por Allan Isaacman aos prazeiros do vale do Zambeze, esses portugueses transformaram-se em transfrontiersmen. (...) se houve indivíduo cujos feitos, factuais ou fictícios, preconizam muitas das características dos portugueses que viveram «fora do império», esse indivíduo foi o alter ego criado por Fernão Mendes Pinto». Uma das explicações mais utilizada para que este facto se verificasse mais em Moçambique, do que nas outras colónias, foi a da maior distância que separa este país de Portugal, o que contribuía para esse, também maior, afastamento físico e psicológico.
(1) Paradigmático desta passagem pelos portugueses nesta época é que ainda hoje a primeira vila em território da Zâmbia se chama "Feira" ( do outro lado do Zumbo em Moçambique, atravessando a albufeira de Cahora Bassa e cujo nome deriva das feiras então realizadas pelos portugueses naquele local) - ver localização no mapa
(2) O liceu na cidade da Beira onde fiz o ensino liceal até ao 7.º ano, tinha precisamente o nome de Pero d'Anaia.